Não Tropece na Língua

Número: 170
Data: 27/01/2021
Título: TENDÊNCIA A VIVER – REGÊNCIA

-- Minha dúvida diz respeito ao uso da preposição de em situações como “a tendência é de”. Tenho encontrado frases ora com a preposição, ora sem, como exemplifico a seguir. Maria Laís Pestana, São Paulo/SP


- Tendência é de que problemas com chuvas aumentem em São Paulo. Portanto, a tendência é que I.

- Tendência é ampliar política de benefícios.

- Tendência é de aumentar as exportações agropecuárias este ano.

- A tendência é de as provas oficiais se expandirem para além do Estado.

- A tendência é as taxas futuras seguirem o comportamento do mercado de câmbio.

- Em outubro, tendência é de melhora. Mercado não teme mais Lula e a tendência é a queda do dólar.


O substantivo tendência pode ser regido por mais de uma preposição, quais sejam a, de, em, para:


Tem tendência à embriaguez.

Opõe-se à sua tendência de conferir o ascendente.

Observou a tendência natural das crianças em contrariar tudo.

A senhora respondeu que não tinha tendências para freira.


Contudo, quando se tem a construção tendência + verbo ser + predicativo (ou oração predicativa), a preposição pode ser omitida. Aliás, a frase fica melhor sem ela:


A tendência é melhorar.

Nossa tendência é conquistarmos o hexa.

A tendência é a queda dos preços.


--- No jornal O Estado de S. Paulo de 1º/10/02, na coluna Espaço Aberto, foi publicado o artigo “Para onde vamos”, de Rubem de Freitas Novaes. Dele extraí o excerto: “Descontado o exagero, é muito apropriada ao momento que vivemos.” Pergunto se a regência do verbo viver está correta. A. A. F., São Paulo/SP


Segundo os dicionários, o verbo viver é usado com a preposição em no caso de complemento de lugar:
 

Ele vive em São Paulo há anos.

Vive na casa do sogro.


A mesma regência acontece nas expressões “viver em paz” e “viver em família”. Também se usa a preposição em quanto se tem um adjunto adverbial de tempo posposto ao verbo:


Nossos avós viveram em um século marcado por profundas transformações.

Vivemos/estamos vivendo numa época de muita violência.

Esse autor viveu no século das Luzes.


Por outro lado, o verbo viver dispensa qualquer preposição quando significa “passar a vida; vivenciar, experimentar, passar por; fruir, desfrutar, aproveitar (a vida)”:


Ela disse que nunca viveu certas experiências.

Vive uma vida folgada.

Os melhores momentos da minha infância foram vividos solitariamente.

Vivemos bons momentos juntos.


Assim sendo, o autor da frase poderia defender sua redação dizendo que ali o verbo viver é transitivo direto (sendo o pronome “que” o objeto direto) porque ele quis lhe dar o sentido de “experimentar, gozar, desfrutar”: os momentos que vivemos = os momentos vividos, os momentos presentes.