Não Tropece na Língua

Número: 095
Data: 21/08/2019
Título: SE SE SABE OU SE SE SENTE...

Elizabeth Daxer, de São Paulo/SP, apresenta duas frases interessantes onde aparece duplo se, que ela pergunta se é uma conjunção condicional e se “devo usá-la apenas uma vez?”:


1) Paulino Jacques também faz uma crítica a essa terminologia, advertindo que é ambígua porque não se sabe se se trata de um novo direito ou do próprio direito do trabalho.

2) Se se aplicasse ao direito do trabalho a simples divisão usual do Direito em público e privado, separar-se-ia aquilo que vive em união interna.


Já o leitor Rubens Viana, de São José dos Campos/SP, quer saber se “é um jogo de palavras? pronome pessoal e condicional?” e extrai um exemplo da coluna Não Tropece na Língua 91:


3) Nessas frases haveria clareza se se observasse a regra citada.


E Ronaldo Nogueira, de Fortaleza/CE, acrescenta sua dúvida: Escrever dois se junto está certo? Qual seria a melhor maneira de escrever esta frase:
 

4) Se se tratar da entrada, informe o responsável pelo setor de compras.


As frases acima, de 1 a 4, estão corretas, perfeitas. Em 2, 3 e 4 seria possível trocar o primeiro SE, que é conjunção condicional, por “caso”, o que contudo não significa melhor estilo, mas apenas uma alternativa de redação:


2) Caso se aplicasse ao direito do trabalho a simples divisão...

3) Haveria clareza caso se observasse a regra citada.

4) Caso se tratar da entrada, informe o responsável...


No mais, é impossível a ênclise (o pronome depois do verbo) porque a conjunção subordinativa se atrai o pronome. E atrai justamente por questões de eufonia. Vejam como soaria mal: *Não se sabe se trata-se... *Se aplicasse-se... *Haveria clareza se observasse-se...


Não é à toa que Camões, há mais de quatro séculos, escreveu estes versos: “Se se sabe ou se se sente, não (n)a digo a toda a gente”... – provocando intencionalmente essa sonoridade. Observem que o usual é pronunciar se no 1° e si no 2°, evitando-se o cacófato se-se.


Eis a explicação gramatical para o caso:


O 1º se é sempre conjunção condicional.

O 2º se é pronome, que pode ter três funções:


- partícula apassivadora:


Se se aplicasse a divisão... [= se fosse aplicada a divisão]

Se se observar a regra...  [= se a regra for observada]


- indicativo de verbo pronominal:


Não sabe se se despede agora ou não, se se casa ou se se deita e espera.


- índice de indeterminação do sujeito:


Para saber se se trata de entrada, é preciso analisar todo o material.

Se se trata de novo direito, saberemos.

Se se ama, sente-se saudades.